Futebol também é cultura (1)
CrônicaO êxtase finalFonte: Site do Inter (www.internacional.com.br)Sempre é difícil para alguém que ama futebol entender o porquê de certas pessoas não gostarem de futebol. Também deve ser difícil - para os que não gostam – entender o porquê de tamanha paixão por uma coisa tão , digamos, prosaica .Mas digo que
deve ser difícil, porque não sei; sou dos mais apaixonados amantes do futebol, dos que não entendem - mas respeitam, ao menos – como alguém pode não gostar de futebol. Paixão, amor, gosto, cada um tem o seu. Mas impossível não deixar um recado para os que não gostam: vocês não sabem o que estão perdendo!
Quarta-feira, estádio Beira-Rio, em Porto Alegre. Jogam Inter x Boca Juniors, da Argentina, pela Copa Sul-Americana.O Boca entalado na garganta dos colorados, que , masoquistas, não se cansam de lembrar da desclassificação na mesma copa pelo mesmo Boca no ano passado, num jogo que o Inter perdeu de virada por 4x2. E a virada, no futebol, é cruel - amargura, entristece, faz lacrimejar os perdedores e , pior de tudo, traz sempre a possibilidade do “Se...” o que prolonga a dor da derrota por muito mais tempo. Novamente contra o Boca Juniors, o grande time da Argentina, o dono do caldeirão sempre fervente em forma de estádio chamado
La Bombonera, mais temido e admirado que qualquer outro local de prática esportiva na América Latina.
Jogo contra time argentino sempre é difícil, estudado, brigado, catimbado, geralmente decidido no detalhe , no descuido mínimo do adversário E esse não era diferente; o Boca marcando bem, a defesa parando os atacantes colorados, que quando conseguiam escapar não davam perigo ao goleiro Abbondazieri, titular da seleção argentina. Segundo tempo começa, o jogo continua o mesmo, dessa vez com um o Boca ameaçando mais nos contra ataques. Passa os 30 minutos e o cansaço dos dois times passa a criar brechas nas defesas. Falta para o Inter, bola na área, Fernandão - o grande , literalmente, ídolo colorado – cabeceia pertinho do gol, mas por cima. Falta na entrada da área do Inter, 43 minutos, Delgado cobra com jeito, por cima da barreira, no canto direito do goleiro colorado Clemer, que dá um salto e joga a bola para escanteio, numa linda defesa, estupenda até.
O futebol, em sua magia que desperta as mais variadas formas de um único sentimento chamado paixão, não é o esporte mais popular do mundo por acaso. É especial, uma junção de pessoas desconhecidas entre si mas que , nesse mundo à parte feito por gente de coração forte, se torna unida umbilicalmente, tão suscetíveis a sentimentos fortes que quando são tocados em seu íntimo por um gol, explodem, gritam, pulam, saem de si em instantes que o tempo para e só volta a andar quando todo esse êxtase é diluído em doses homeopáticas de realidade extra-campo, de uma vida real que o futebol insiste em não querer fazer parte para poder, assim, fazer o que bem entender com a sua vida.
Aos 45 minutos, o juiz anunciava três minutos de desconto. A torcida colorada ainda acreditava na vitória, lá no fundo, mas já começava a se conformar com o 0 x 0, afinal, é o Boca, mesmo sendo difícil no jogo de volta dá para se tentar a vitória, nem tudo está perdido. E essa conformação fez com que o êxtase causado pelo gol marcado, que viria logo a seguir, no último lance da partida, se tornasse ainda maior, algo completamente indescritível na nossa realidade, talvez sendo possível na outra, a que o futebol é lei e rei e que nós somos súditos fiéis ansiosos por mais pão e circo.
Aos 48 minutos e 22 segundos, uma falta longe da área, bola levantada, o atacante colorado Rafael Sobis desvia de cabeça, engana os zagueiros que estavam acompanhando a bola, Fernandão chega como uma flecha na frente de todos, sozinho, e quase de carrinho, com a perna esquerda, toca para o fundo das redes. Termina o jogo, vitória do Inter.
Ainda há outro jogo, o da volta, na Bombonera. O Inter pode até não se classificar, mas esse jogo, essa vitória, esse êxtase de me fazer ficar horas depois do jogo escutando os comentários nas rádios, olhando os lances na TV, os comentários dos torcedores e no outro dia ler tudo sobre o jogo nos jornais, essa agradável satisfação que essas coisas trazem ninguém vai me tirar. E , por essas e outras, é que eu não entendo como alguém pode não gostar de futebol.
-Leonardo Foletto-